O multiartista Pedro Maciel leva escultura à vitrine da TV – 23/04/2025 – Rede Social

A imagem mostra uma estante decorativa com prateleiras iluminadas em azul. Na estante, há livros organizados, uma lâmpada de mesa redonda e um objeto de madeira com recortes. Na parte inferior, há livros com capas coloridas, incluindo um com a palavra

A próxima temporada do programa “Conversa com Bial”, que estreou nesta segunda (21), conta com novos protagonistas silenciosos em cena: esculturas do mineiro Pedro Maciel.

As peças do multiartista, que é também escritor, pintor, design e jornalista, fazem parte da série “A Natureza Fala por Nós”, uma proposta estética e uma convocação à escuta sensível do que a mãe Terra ainda tenta nos dizer.

Visualmente potentes e poeticamente comprometidas com a ideia de que a arte pode ser um gesto na direção de uma conexão mais profunda com a natureza, três obras de Maciel vão se revezar ao longo do ano no cenário do programa apresentado por Pedro Bial na TV Globo.

As peças são feitas do que o artista chama de “madeiras de redescobrimento”. “Escolho madeiras velhas para criar esculturas. O próprio design delas me guia”, explica. “Ao trabalhar com madeiras novas, só uso sobras, porque são imprestáveis para a confecção de móveis. Cortar uma árvore enlouquece um rio.”

A série de esculturas que foi parar na vitrine televisiva traduz a filosofia do artista: o compromisso com o reuso, a escuta do invisível e arte em suas múltiplas manifestações.

“A natureza é uma casa de eternidades que os homens mortais ignoram”, define. “Será que um dia vão ouvir as raízes das árvores, os rios voadores, as lágrimas das estrelas?”

Na apresentação da série, o escritor faz uma ode ao seu ofício. “O artista ouve o tempo circular e, por isso, o transcende”, diz ele, para quem “a arte é a sofisticação da simplicidade”.

Maciel, 66, é uma voz singular na literatura brasileira contemporânea. Com uma escrita filosófica e experimental, ele explora temas como identidade, memória, finitude.

Em “Como Deixei de Ser Deus” (ed. Topbooks, 2009), seu romance de estreia, ele brinca com o sagrado e o profano em uma narrativa que desafia fronteiras entre o real e o imaginário. A obra foi traduzida para o inglês e o italiano.

Já em “Retornar com os Pássaros” (ed. LeYa, 2010), o autor mergulha na delicadeza da linguagem em um texto hipnótico e poético, ao propor ao leitor um jogo entre tempo e espaço.

Em seu romance mais recente, lançado em 2023, “O Diário Perdido de Shakespeare” (ed. Iluminuras, 144 págs, R$ 85), Maciel reafirma seu gosto por construções narrativas ousadas e jogos metaficcionais. Nele, recria uma escrita apócrifa de um dos maiores dramaturgos da história, numa mistura de erudição, humor e crítica literária.

“A ambição da prosa inovadora de Pedro Maciel afirma-se fora do ritmo e do compasso disto a que classificamos nas salas de aula e nos manuais como Literatura brasileira ou ocidental”, avalia o escritor Silviano Santiago, sobre a obra do seu conterrâneo mineiro.

“A prosa inspirada e utópica do autor vai levar o leitor a deslocamentos súbitos e sucessivos do eu por esferas celestes nunca dantes navegadas.”

Leitor voraz dos clássicos gregos e da literatura universal e brasileira, Maciel bebe na fonte do conterrâneo Guimarães Rosa. “Li Grande Sertão Veredas não sei quantas vezes. Sou da boca do sertão”, diz ele, natural de Sete Lagoas.

Dono de uma formação humanística sólida, ele conta ter frequentado o curso de filosofia como ouvinte, graduou-se em comunicação social, mas nunca fez escola de arte.

Com oito livros publicados — entre romances, contos e ensaios — Maciel transita com fluidez entre diferentes linguagens artísticas, guiado por uma sensibilidade rara e por um olhar que busca transcendência na palavra, na madeira ou no silêncio das formas.

O escritor renega os dois primeiros livros de poemas publicados quando tinha 20 anos, um deles com ilustrações de Amílcar de Castro. “A poesia é o gênero mais difícil. Qualquer pessoa com dor de cotovelo vai fazer seus versos”, diz.

É, no entanto, o orgulhoso organizador do livro “Poemas Escolhidos de Glauber Rocha“, a convite de Lúcia Rocha, mãe do cineasta baiano.

Ao saber que Glauber havia escrito uns 400 poemas, Maciel mergulhou em arquivos numa pequena sala do Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro.

“Selecionei poemas de várias estilos, do verso livre ao soneto, e aqueles que retratam o tempo em que ele foi exilado e preso, com desenhos que Glauber criou na cadeia.”

Depois de enveredar pela poesia e pela prosa, Maciel se aventurou pela pintura e chegou ao design de móveis, desdobramento recente e natural do seu trabalho em madeira.

O ateliê de pintura montado em sua casa em Belo Horizonte virou também oficina de design de móveis há três anos, quando foi convidado a desenvolver e assinar uma linha para a Top Móveis, principal marcenaria da capital mineira.

Influenciado pela história dos móveis, o mineiro criou a poltrona Andy, em homenagem ao artista pop Andy Warhol.

Surgia também a série de aparadores batizados com os nomes dos mais importantes biomas brasileiros: Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal. Seu mobiliário sofisticado é desenvolvido com parceiros como a Tetro Arquitetura, referência em projetos que se destacam pela sustentabilidade e inovação.

“Optei por usar madeiras coloridas, numa cartela de cores que tem a ver com os trópicos”, ressalta, sobre a coleção intitulada Tekohá, natureza em tupi-guarani.

Em bom português, ele continua a exercer o jornalismo, como colaborador eventual na Folha e em outras publicações.

Seu primeiro editor foi Zuenir Ventura, no Jornal do Brasil. “Onde você quer escrever?”, indagou o veterano ao ler dois textos do jovem de 21 anos que passou então a colaborar para o caderno Ideias.

Do seu arquivo de entrevistas para o programa Impressões Gerais, na rádio Gerais, ele escava conversas preciosas e inéditas com grandes nomes, como Ferreira Gullar, Fernanda Montenegro, Manoel de Barros, Chico Buarque e Antunes Filho.

“São entrevistas atemporais”, diz ele, que foi elogiado por Jô Soares, diante de uma pauta nada óbvia de perguntas. “Só entrevisto quem eu admiro.”

Um dos mestres que mais admira é Leonardo da Vinci. Assim como o gênio italiano, o mineiro explora seus multitalentos como um artista renascentista do século 21.



Fonte ==> Folha SP

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