Reforma tributária e o novo êxodo industrial: rumo ao Sudeste? – 24/04/2025 – Que imposto é esse

Um homem está sentado em uma mesa em um ambiente corporativo. Ele usa um terno escuro e uma gravata azul com pontos brancos. O homem tem cabelo escuro e uma expressão séria. Ao fundo, há uma janela com persianas, através da qual se pode ver uma paisagem urbana com montanhas ao longe, incluindo uma famosa montanha do Rio de Janeiro (Pão de Açúcar).

A recente aprovação da reforma tributária gerou debates intensos sobre seus impactos. Entre as mudanças mais significativas estão a unificação de ICMS e ISS no novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a migração da tributação da origem para o destino. Embora a proposta busque simplificar o sistema, ela suscita preocupações sobre um possível êxodo das indústrias das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste para o Sudeste.

Historicamente, estados menos desenvolvidos usaram incentivos fiscais para atrair investimentos e fomentar crescimento. A concessão de benefícios via ICMS e ISS estimulou a instalação de indústrias nesses locais, gerando emprego e renda. Agora, com o fim desses incentivos, as empresas podem buscar maior proximidade a mercados robustos e melhor infraestrutura, o que pode desequilibrar ainda mais o quadro regional.

Esse movimento industrial assemelha-se a um “Far West às avessas”: se antes pioneiros desbravavam regiões distantes, hoje há um retorno ao já consolidado Sudeste. Ao priorizar a tributação no destino e estimular as empresas a se estabelecerem onde há maior consumo, a reforma pode concentrar ainda mais atividades em locais com infraestrutura e mão de obra especializada, intensificando disparidades e contrariando o objetivo de equilíbrio federativo.

Os impactos dessa migração extrapolam a questão econômica. A saída de indústrias das regiões menos desenvolvidas pode acarretar perda de empregos, queda de arrecadação e enfraquecimento das economias locais. Municípios que dependem da atividade fabril podem entrar em um ciclo de empobrecimento, comprometendo investimentos em educação, saúde e infraestrutura. No limite, isso tende a frear iniciativas de desenvolvimento, ampliando a distância entre as áreas periféricas e o Sudeste.

Para minimizar esses efeitos, a reforma cria mecanismos de compensação, como o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional e o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais. Contudo, esses fundos –custeados pela União – podem se tornar mera transferência de custos, sem resolver a falta de competitividade e a precariedade estrutural em regiões afastadas. Ainda que expressem valores consideráveis no papel, há dúvidas sobre a efetividade a longo prazo. Essa conjuntura reforça a necessidade de repensar o fim dos incentivos fiscais ou, ao menos, manter alguma flexibilidade no modelo para evitar a perda de capacidade produtiva nessas áreas.

A experiência internacional oferece lições valiosas. Países extensos, como Estados Unidos e China, adotam políticas de incentivo para reduzir a concentração de indústrias em polos consolidados. No Brasil, a Zona Franca de Manaus exemplifica esse papel, embora haja debates sobre aprimoramentos. Caso benefícios sejam encerrados de forma abrupta, as regiões beneficiadas podem ver décadas de esforços de interiorização ameaçadas, o que poderia inviabilizar conquistas de geração de emprego e renda.

É fundamental que a modernização do sistema não ocorra em detrimento das regiões menos desenvolvidas. A reforma pode corrigir distorções históricas, mas requer cautela. Modelos como alíquotas diferenciadas, regimes especiais para setores estratégicos e a manutenção parcial de incentivos podem equilibrar necessidades nacionais e realidades locais. Do lado industrial, investimentos em inovação e eficiência logística podem atenuar custos adicionais advindos do fim das vantagens fiscais. Em contrapartida, regiões que desejem continuar recebendo empresas precisam fornecer condições mínimas de competitividade, com políticas públicas que melhorem infraestrutura e capacitação de mão de obra.

O diálogo entre governo federal, estados e municípios, junto à participação do setor privado, será crucial para traçar estratégias que resguardem a competitividade das regiões menos desenvolvidas. A implementação das leis complementares da reforma deve priorizar a efetividade dos fundos de compensação e mecanismos flexíveis de benefício fiscal. Em última análise, o fim total dos incentivos pode agravar desigualdades que a própria reforma pretende atenuar.

O sucesso da reforma depende não só de mudanças legislativas, mas de políticas que fomentem um crescimento inclusivo e sustentável. Se faltarem iniciativas para adaptar o novo modelo às realidades regionais, corre-se o risco de estimular a migração industrial aos polos tradicionais, em prejuízo das demais localidades. Nesse sentido, refletir sobre o modelo de desenvolvimento que se almeja para o país é fundamental para evitar desequilíbrios irreversíveis.

Refletir sobre o tipo de desenvolvimento pretendido para o país é essencial para que essas mudanças não resultem em desequilíbrios irreversíveis. Se os fundos compensatórios se mostrarem insuficientes, a própria União poderá arcar com uma conta considerável, sem garantir avanços reais nas áreas menos favorecidas. A concessão parcial ou controlada de incentivos, aliada a uma transição gradual, pode ser determinante para conciliar competitividade e desenvolvimento regional.



Fonte ==> Folha SP

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *